Menino deficiente de Gaza vive em hospital Israelense

Menino deficiente de Gaza vive em hospital Israelense

Diaa Hadid

Em sua curta vida, o menino Mohammed al-Farra conheceu apenas um lar: a ala infantil do Hospital Tel Hashomer de Israel. Nascido em Gaza, com uma rara doença genética, as mãos e os pés foram amputados devido a complicações da sua condição, o menino de três anos e meio se movimenta em uma pequena cadeira de rodas vermelha. Os pais o abandonaram, o governo palestino não contribui para o seu sustento e ele vive no hospital com seu avô. “Em Gaza não existem condições nem um lar onde ele possa viver”, diz o avô, Hamonda al-Farra. “Ele não pode fazer nada sozinho, nem comer nem vestir-se. A vida dele é zero sem ajuda”, diz o avô no Hospital Infantil Edmond e Lily Safra, parte do complexo Tel Hashomer na cidade de Ramat Gan. A situação de Mohammed é um exemplo extremo do duro tratamento que algumas famílias dispensam aos seus deficientes, particularmente em áreas onde predominam costumes tribais na Faixa de Gaza, embora muitos palestinos se esforcem para combater tais atitudes. E demonstra também o legado da cultura fortemente patriarcal que induz as mulheres ao casamento com primos de primeiro grau e permite a poligamia, deixando as mães sem poder sobre o destino dos seus filhos. [caption id="attachment_10668" align="aligncenter" width="408"]Mohammed and his grandfather (Photo: AP) Mohammed and his grandfather (Photo: AP)[/caption] Mohammed foi levado para Israel logo após o seu nascimento para um tratamento de emergência. O problema genético enfraqueceu o seu sistema imunológico e uma infecção destruiu os pés e as mãos, tornando necessária a amputação, dizem os médicos. [caption id="attachment_10669" align="aligncenter" width="408"](Photo: AP) (Photo: AP)[/caption] No meio do tratamento a mãe abandonou Mohammed porque o marido, com vergonha do filho, ameaçou tomar uma segunda esposa se ela não deixasse o bebê e voltasse para casa na cidade de Khan Yunis, no sul de Gaza, onde a poligamia é permitida, embora não seja comum. Mas é uma ameaça poderosa para as mulheres que temem a competição com uma nova esposa. [caption id="attachment_10670" align="aligncenter" width="408"](Photo: AP) (Photo: AP)[/caption] Agora, Mohammed passa os dias em tratamento e aprendendo a usar as próteses das pernas. O avô, de 55 anos, cuida dele. Os médicos israelenses, que se afeiçoaram ao menino, arrecadam fundos para cobrir as despesas, permitindo assim que ele e o avô possam morar na ala pediátrica. Mas ainda não se sabe por quanto tempo ele poderá permanecer no hospital. Como palestino, Mohammed não tem direito à residência permanente em Israel. A família dele não o quer de volta, disse o avô. Os pais, procurados pela Associated Press, recusaram fazer comentários. Enquanto o avô falava, Mohammed usava seus joelhos e cotovelos, escurecidos e cobertos de cicatrizes provocadas pela pressão constante, para tentar subir e descer os degraus de uma escada. Usando os braços, tentou segurar uma garrafa verde que encontrou num carrinho, as próteses das pernas jogadas no chão. Engatinhando em direção ao colo do avô, gritou “Baba!”, vovô em árabe, “Ana ayef”, uma mistura de árabe com hebraico para “Estou cansado”. [caption id="attachment_10671" align="aligncenter" width="408"](Photo: AP) (Photo: AP)[/caption] O doutor Raz Somech, médico chefe do Departamento de Imunologia Pediátrica do Tel Hashomer, atribui a doença genética de Mohammed às várias gerações de casamentos entre primos na família dele, inclusive seus pais. Nas regiões profundamente patriarcais de Gaza – não em todo o território – os homens acreditam ser seu direito casar com as primas, mesmo contra a vontade delas. Os pais aprovam este costume porque ele fortalece os laços familiares e garante que a herança permaneça na tribo. Repetidas gerações de casamentos consanguíneos complicam a situação. Ainda não se sabe qual é o efeito disso nos índices de deficiências em Gaza, mas Somech diz que um terço dos pacientes do seu departamento são palestinos e a maioria apresenta distúrbios genéticos resultantes destes casamentos. Para piorar a situação as crianças deficientes são frequentemente estigmatizadas. Algumas famílias escondem as crianças para que não prejudiquem as chances de conseguir casamento para os irmãos normais. Estes deficientes são vistos como um estorvo numa região muito pobre. Cerca de 183.600 residentes de Gaza, ou 10,8% dos 1.7 milhões de habitantes, apresentam algum tipo de deficiência que afeta sua saúde mental, sua visão, audição ou mobilidade. Cerca de 40.800 pessoas sofrem com deficiências severas, de acordo com a Secretaria Palestina de Estatística. Em 2011 esta secretaria relatou que dois terços dos jovens deficientes de Gaza são analfabetos e 40% deles nunca foram à escola, o que sugere que seus pais os mantêm em casa e não têm os meios para educá-los, um cenário provável no território onde dois terços da população vive abaixo da linha de pobreza e 90% dos deficientes estão desempregados. No entanto, as atitudes estão mudando em Gaza. O ativista Eid Shaboura diz que o caso de Mohammed é “extremo”: “Já vemos algum progresso, mudanças, mas não no nível desejado”. Cerca de dez grupos de ajuda em Gaza realizam grandes esforços para proporcionar oportunidades aos deficientes. Palestinos com deficiência auditiva fabricam produtos para butiques no centro Atfaluna, Nossas crianças, em árabe. Neste ano foi aberto um restaurante dirigido por deficientes auditivos. Os dirigentes de Gaza têm enfrentado a questão nos últimos anos. Os casamenteiros ajudam homens com visão deficiente a encontrarem noivas e ajudam a cobrir os gastos do casamento. Combatentes palestinos cadeirantes, feridos em combate, recebem honras militares. O hospital que seve de lar para Mohammed é um dos poucos locais de encontros para israelenses e palestinos. Com o sistema médico de Gaza sobrecarregado, os pacientes frequentemente recebem permissão para fazer o tratamento em Israel. Uma geração atrás, milhares de palestinos, inclusive o avô de Mohammed, trabalhavam em Israel. Mas Israel começou a restringir o movimento dos palestinos com a escalada da violência, desde que o grupo militante Hamas tomou o poder em 2007. Recentemente, no hospital das crianças, vimos pacientes e médicos conversando em hebraico e árabe. Mulheres com a cabeça coberta com véus passeavam pelos corredores. Uma judia ortodoxa afagou carinhosamente a cabeça de Mohamed e sorriu para Farra. De acordo com Somech, a coleta de fundos dos médicos cobriu o tratamento de Mohamed. Um doador ofereceu 28 mil dólares para as próteses do menino. A Autoridade Palestina da Cisjordânia deveria transferir fundos para hospitais israelenses, mas deixou de cobrir as despesas de Mohammed seis meses após a chegada dele. Funcionários da saúde palestina dizem que não têm registro do caso. Em muitos casos a Autoridade deixou de pagar os tratamentos dos pacientes por falta de recursos. Farra diz que assumiu o cuidado do menino para salvar o casamento da filha. Ele dorme ao lado do neto e cuida da sua higiene e alimentação: “Cuidar desta criança é uma boa ação “, diz ele. Mas após anos de cuidados ele diz que está cansado e quer voltar para casa. Ele gostaria de encontrar um lar adotivo ou um cuidador para o neto. “Ele precisa de muitas coisas na vida”, diz Farra enquanto massageia o braço do menino que está no seu colo. “Ele precisa de um lar”. Artigo publicado jornal Times of Israel citado no WJC – World Jewish Congress em 06 de maio de 2013. Tradução: Adelina Naiditch]]>

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