Reflexões sobre um Dia das Mães em Bergen Belsen e Auschwitz

Reflexões sobre um Dia das Mães em Bergen Belsen e Auschwitz

12/05/2011 No domingo, dia 13 de maio de 1945, cinco dias após o fim da 2ª Grande Guerra na Europa, foi o Dia das Mães nos Estados Unidos. Em Bergen Belsen, na Alemanha, no entanto, nada havia para minha mãe comemorar enquanto participava de um monumental esforço para salvar tantas vidas quanto possível dos sobreviventes doentes daquele campo de concentração nazista. Quando as tropas britânicas entraram no campo em 15 de abril de 1945, elas encontraram, nas palavras do Tenente-Coronel Mervyn Gonin, comandante da 11ª Unidade de Ambulâncias, “pelo menos 20.000 doentes que padeciam das mais virulentas doenças conhecidas e 30.000 homens e mulheres que poderiam morrer se não fossem logo tratados, alimentados e removidos daquele campo de horrores. Não tínhamos médicos, enfermeiras, leitos, roupas, remédios, termômetros e outros itens essenciais para o tratamento médico e, o pior de tudo, não havia uma linguagem comum.” Minha mãe, então conhecida como Dra. Hadassah ou Ada, Bimko, uma dentista de Sosnowiec, Polônia, que tinha estudado medicina na Universidade de Nancy, na França, organizou e dirigiu um grupo de médicos e enfermeiras reunido entre os sobreviventes e que trabalhou durante muitas semanas ao lado dos médicos militares britânicos. Gonin descreveu-a como “a mulher mais corajosa que já conheci, que realizou milagres de cuidados e cura, sendo ajudada apenas pela voz e pela disciplina de um sargento do Regimento de Guardas.” Para situar o papel da minha mãe no drama da pós-liberação de Bergen Belsen (descrita em detalhes na obra de Ben Shephard, Após o Amanhecer, a Liberação de Bergen Belsen, 1945) no contexto histórico devido, devemos recordar a noite de 3 e 4 de agosto de 1943, quando, logo após a sua chegada a Auschwitz-Birkenau, meus avós, o primeiro marido da minha mãe e seu filho de cinco anos e meio – meu irmão – foram imediatamente mortos nas câmaras de gás daquele campo de morte. Jean Paul Sartre escreveu: “o homem não é apenas aquilo que imagina ser, mas é também aquilo que quer ser. Um ser humano nada mais é que o seu próprio projeto, ele existe apenas naquilo que ele imagina ser, portanto, nada mais é que a soma das suas ações, nada mais que sua vida.” Devastada pela perda da sua família, minha mãe – assim como a maioria de suas companheiras e como os alemães queriam – sentia-se desorientada, humilhada e privada de sua identidade. Ela foi forçada a usar as roupas de prisioneira, sua cabeça foi raspada e seu nome foi substituído por um número – 52406 – tatuado no seu braço. Ela escreveu em suas memórias: “eu me sentia humilhada e envergonhada, odiava dormir com aquelas roupas. Tinha vergonha de admitir que estava faminta, tinha vergonha de tomar banho e me expor nua diante de tantas outras mulheres. Eu tinha vergonha da minha aparência e raramente falava.” Então, aconteceu um fato quase surreal, catártico. Ela contou: “Uma manhã, após a chamada, caiu uma chuva torrencial. Nós queríamos voltar para as barracas, mas fomos forçadas pelas mulheres das SS a permanecer ali por muitas horas. Enquanto a chuva caia sobre nós eu percebi o quanto estávamos desamparadas. Meus olhos se encheram de lágrimas, as primeiras desde a minha chegada. Elas se misturavam com a chuva enquanto eu soluçava e, então, eu me reencontrei.” Devido ao seu treinamento médico, ela foi designada pelo notório Joseph Mengele, médico chefe de Birkenau, para trabalhar na enfermaria do campo em outubro de 1943. Lá, ela pode salvar a vida de muitas companheiras, realizando cirurgias rudimentares, camuflando suas feridas e enviando-as para trabalho externo antes das seleções. Em novembro de 1944 Mengele enviou minha mãe e mais oito internas de Birkenau para atuarem como médicas em Bergen Belsen, na Alemanha. Novamente, o potencial humano para o bem superou o mal. Em dezembro de 1944, começando com 49 crianças holandesas, minha mãe organizou aquilo que ficou conhecido como Kinderheim, o lar das crianças, no interior do campo de concentração. Hela Los Jafe, outra prisioneira de Bergen Belsen, lembra como “Ada caminhava de bloco em bloco, recolhia as crianças, vivia com elas e cuidava delas.” Havia crianças da Polônia, da Tchecoslováquia e de outros países. Algumas tinham sido enviadas de Buchenvald e outras de Theresienstadt. Junto com outras mulheres, minha mãe manteve 149 crianças judias vivas em Bergen Belsen durante o terrível inverno e início da primavera de 1945. Hela Jafe continua: “ as crianças eram muito pequenas e doentes e nós tínhamos de lavá-las, vesti-las, acalmá-las e alimentá-las… A maioria estava com disenteria e diarréia e apenas permanecia deitada… Havia pouca comida, mas de alguma maneira Ada conseguia alguma coisa especial e pão branco dos alemães… E, então, surgiu o tifo… Ada conseguia injeções, chocolate, pílulas e vitaminas, não sei como. Apesar de a maioria das crianças estar doente, graças a Ada quase todas sobreviveram.” Onde minha mãe encontrou a força para salvar os outros em vez de concentrar-se na sua própria sobrevivência sempre foi um mistério para mim. Talvez a sua devoção às crianças em Bergen Belsen, e nas semanas após a liberação do campo, aos milhares de sobreviventes doentes, foi a sua maneira de lidar com a sua incapacidade de proteger o seu próprio filho. Albert Camus escreveu: “No meio do inverno eu descobri que havia um verão invencível dentro de mim.” Autor – Menachem Z. Rosensaft Fonte: site do WJC – World Jewish congress Tradução – Adelina Naiditch  ]]>

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